© Rubens Queiroz de Almeida
Quando eu estava aprendendo a digitar, aconteceu uma coisa muito estranha. De uma hora para a outra eu comecei a mentalizar, sempre que via ou pensava em algo, os movimentos dos meus dedos para digitar os meus pensamentos. Isto durou por volta de três meses. No começo até que era engraçado. Eu via um outdoor na rua e meus dedos já se moviam para digitar o texto do cartaz. E assim se dava com tudo. Depois de algum tempo ficou insuportável e eu não conseguia controlar conscientemente este processo. Pensei que ia ficar louco. Surpreendentemente, da mesma forma que esta mania apareceu, ela foi embora. O resultado foi que me tornei um datilógrafo extremamente ágil, capaz de digitar com uma velocidade fora do comum.
Outra coisa interessante que aconteceu comigo, desta vez no aprendizado da língua inglesa, foi minha paixão pelas histórias do Charlie Brown e sua turma. Eu me lembro quando tinha seis anos de idade (eu ainda não sabia ler) e estava em um supermercado. Eu vi algumas revistinhas do Snoopy e fiquei maravilhado. Pedi ao meu pai para comprar algumas para mim, mas como criança pede tudo, meu pai seguiu em frente e não me deu as revistas. Mas eu nunca me esqueci delas.
Muito mais tarde, quando eu já tinha dezoito anos, eu encontrei umas cinco revistas do Snoopy na rodoviária de São Paulo. Estas cinco revistas foram o meu tesouro. Todos os dias, antes de dormir, eu lia todas as cinco. Em pouco tempo sabia todos os diálogos de cor, as figuras, as situações. Era um prazer constante. As revistas eram todas em português.
Alguns anos mais para a frente, já no meu primeiro emprego como engenheiro, eu encontrei em uma livraria do aeroporto do Rio de Janeiro, diversas revistas da turma do Charlie Brown, em inglês. Mal pude acreditar. Comprei quantas revistas pude e comecei com a minha rotina, de ler e reler as histórias. A princípio, não entendia muito dos diálogos, mas com a ajuda das gravuras e da constante releitura, fui construindo os significados e memorizando todas as conversas. Nunca usei o dicionário para descobrir o significado de alguma palavra. Ler com um dicionário do lado é a minha idéia de tortura mental. A memorização se deu pela constante releitura, não por um interesse meu em decorar tudo, algo que sempre detestei.
Pois então, esta maneira pouco usual de aprender um idioma me ajudou enormemente. Quando tinha a oportunidade de conversar ou escrever em inglês dali para a frente, vinham à minha mente trechos inteiros de conversas dos meus livros do Snoopy, que eu então tinha apenas o trabalho de alterar aqui e ali para inseri-los em uma conversa ou texto. Meu discurso em inglês ficou muito elegante, pois os diálogos da turma do Charlie Brown são muito inteligentes e bem escritos.
Mas por qual razão estou contando tudo isto? Certamente não é minha intenção abrir uma escola de datilografia ou de idiomas, onde em um caso ensino a datilografia mental e em outro obrigo os estudantes a ler centenas de vezes o mesmo material. De forma alguma. O meu objetivo é ilustrar duas situações de aprendizado extremamente bem sucedidas, para mim apenas, é claro. Ninguém me disse que eu deveria aprender estas duas habilidades deste jeito. Na verdade eu nem sei porque eu fiz desta forma. No caso da datilografia é um completo mistério para mim a razão pela qual eu comecei a imaginar na minha máquina de escrever mental tudo o que via ou lia. No caso do inglês o que é bem concreto é minha enorme admiração (obsessão?) pelas historinhas da turma do Charlie Brown. Aprender o inglês foi apenas um efeito colateral, uma consequência (ainda bem).
De qualquer maneira, não podemos deixar de chamar estas duas abordagens de estratégias de aprendizado. Talvez só funcionem para mim, mas não deixam de ser estratégias. Eu não sabia, na época, que o que eu fazia era uma forma de aprender. A estratégia de digitação, na verdade, até me irritava bastante.
Eu quero chamar a atenção para um fato bastante comum. Não valorizamos, na maior parte dos casos, as nossas próprias estratégias de aprendizado. É certo que existem muitas metodologias interessantes e válidas que, como tudo na vida, funcionam para alguns e não funcionam para outros. Com quem a metodologia funciona está ótimo, para quem dá errado o problema não é no método em particular e sim com o aluno, que é uma aberração ou um desvio que merece “cuidados” especiais. O pior é que acreditamos nisto. Estratégias individuais, como os dois exemplos que citei, são frequentemente condenadas e rotuladas como danosas.
Um hábito que adquiri, é sempre que posso, perguntar quais estratégias de estudo as pessoas que encontro adotam. As respostas são as mais variadas e refletem, antes de tudo, as particularidades de cada um.
Não acho que valha a pena descrever com detalhes estas estratégias, pois o meu objetivo com este artigo não é iniciar mais uma seita de aprendizado. O que desejo é apenas alertar para o fato de que qualquer estratégia de aprendizado só irá funcionar se estiver de acordo com a nossa natureza e nos der prazer. Existem muitos livros que nos ensinam diversas estratégias interessantes. Mas lembre-se bem, uma estratégia só é boa se serve para você. Se não servir, procure outra ou então valorize as que você mesmo desenvolveu.
Sinta-se à vontade para escolher, dentre as várias metodologias de ensino existentes hoje em dia, aquela que melhor lhe convier. Mas não se esqueça nunca de olhar para dentro de você mesmo e valorizar aquilo que o seu próprio subconsciente lhe diz. Se você é um educador, respeite a individualidade de seus alunos, pois certamente, dentro de cada um deles, existem tesouros inestimáveis.
Uma recomendação, não deixem de ler a história Era uma Vez. De uma certa forma, esta história fala quase que a mesma coisa que este artigo.